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No dia de um de seus primeiros recitais, como compositor “eletroacústico”, Rodolfo Caesar teve de correr às pressas à Ordem dos Músicos do Brasil, seção Rio de Janeiro, para conseguir o alvará necessário à realização do evento. Aliviado, deixou o recinto ainda que com uma não-permissão: a entidade em nada se opunha e nada exigia, já que aquilo que apresentaria “não se tratava mesmo de música nem de músicos...”. E é assim mesmo que, de certo modo, nos sentimos nas apresentações de suas obras. Dono de um cérebro aberto e profundamente abstrato, Caesar é capaz de traçar os mais surpreendentes fios entre objetos díspares do mundo real, suas impressões do mundo sensível das artes e da natureza, de formas em estado de latência... São visões e alucinações que abrangem do silêncio a uma irremediável despercepção dos gêneros musicais que desfilam por sua janela aberta para as encostas de Santa Teresa e de onde exalam extratos mineiros rigorosamente cultivados. Reúne tudo isso em sondagens pelo universo dos sons que logo extrapolam sua materialidade e despertam em seus ouvintes o reconhecimento da alienação reinante, seja no campo das ideias “solidamente” construídas, seja na ilusão de que são frutos do acaso as mazelas quotidianas: mesmo por trás de sonoridades marcadas descortina-se um universo crítico e poético. Ainda assim, podemos vê-lo com frequência em lugares públicos em busca de ressonância para suas ideias. Por exemplo, movido pela necessidade de frear tendências positivistas na apreciação da arte contemporânea, sugeriu que a música estaria presente também no simples som da água escorrendo em uma instalação na qual uma torneira destacava-se em um quarto vermelho vazio. Entregou-se ele também a esta ideia, com uma obra que consiste em um alto-falante em movimento, mas em silêncio, insinuando a muda recordação de Isolda frente a um Tristão imaginário.

Natural do Rio de Janeiro, 1950, Rodolfo Caesar estudou no Instituto Villa-Lobos com Marlene Fernandes, Bohumil Med e Reginaldo Carvalho. Especializou-se no Groupe de Recherches Musicales/Conservatoire de Paris, com Pierre Schaeffer e Guy Reibel, de quem foi assistente, doutorando-se mais tarde sob a orientação de Denis Smalley, na Inglaterra. Frequentou o mestrado em filosofia no IFCS/UFRJ. Foi um dos fundadores do Estúdio da Glória no Rio de Janeiro, onde teve a oportunidade de lecionar e compor com auxílio de tecnologias eletroacústicas. Foi professor também no Conservatório Brasileiro de Música e na Universidade Estácio de Sá, produtor e intérprete em programas de rádio sobre música contemporânea, além de participar regularmente de eventos no Brasil e no exterior. Hoje é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coordena o Laboratório de Música e Tecnologia (LAMUT). Ele dirige ainda o sítio da internet sussurro.musica.ufrj.br, onde pode ser ouvida grande parte de suas obras e inúmeras produções musicais contemporâneas brasileiras

Obras de sua autoria tiveram destaque em concursos e seleções em Bourges, Noroit, Keele, Tribuna da Unesco, algumas das quais frutos de encomendas e resultando em premiações como: Arts Council of Great Britain, Arts Council of England, Institut National de l’Audiovisuel / Groupe de Recherches Musicales, Fundação Vitae e Programa RioArte de Bolsas. Recebeu o prêmio Sérgio Motta em 2004 e uma menção em Bourges com a obra 3 Clips, em que explora relações entre a visualidade e a escuta. Relacionamentos interdisciplinares constituem o núcleo de interesse tanto em seu trabalho de criação artística quanto em sua produção teórica.
As quatro músicas deste álbum foram compostas entre 1992 e 1997. As três primeiras na Inglaterra no âmbito de seu doutoramento: Volta Redonda, Revoluções Industriais e A 5 noite em concha. Círculos ceifados (1997), que tem origem em uma ideia similar, foi composta no Brasil como parte de um trabalho subvencionado pela Bolsa Vitae de Artes (o livro de mesmo título, publicado em 2008, é parte deste projeto). Elas possuem em comum a exploração e estruturação a partir de desenhos espaciais circulares, espirais e cônicos. Os recursos técnicos diferem muito: Volta Redonda foi composta nos estúdios da University of East Anglia; as demais peças foram realizadas em estúdio pessoal, ora no ambiente MIDI, ora utilizando extensivamente os recursos de uma placa de áudio. Todas as peças foram concebidas originalmente para uma eventual difusão em estéreo como nesta produção.

Marcos Branda Lacerda
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On the day he was due to perform one of his first recitals as an “electroacoustic composer”, Rodolfo Caesar had to rush to the Brazilian Musicians Association in Rio de Janeiro to get the necessary authorization for the concert. He was relieved to leave the building even if what he had was a non-permit: the organization had neither objections nor demands, since the show “was not about music or musicians”... And that is actually how we feel, to a certain extent, while listening to his work. With an open and deeply abstract mind, he is able to trace the most surprising threads between odd real world objects, his impressions of the sensitive world of arts and nature, of forms in latent state... These are visions and hallucinations that range from silence to an irrevocable de-perception of the musical genders that parade in front of his windows that open to the Santa Teresa hills and exhale carefully blended extracts from Minas Gerais. He gathers it all by probing the universe of sounds, extrapolating their materiality and awakening the listeners’ recognition of the alienation that dominates both the field of “solid” ideas and in the illusion of believing that everyday frustrations are a fruit of chance: a critical and poetic universe unveils itself even behind recognizable sonorities. Still, we can often see him in public places looking for resonances for his ideas; for instance, in an attempt to curb positivist tendencies in the appreciation of contemporary art, he suggested music could be found even in the sound of running water in an installation where a faucet stood out in an empty red room. He also followed this idea with a piece consisting of a moving, though silent, loudspeaker insinuating Isolde’s silent recollection of an imaginary Tristan.

Rodolfo Caesar was born in 1950 in Rio de Janeiro, where he studied at Instituto Villa- Lobos with Marlene Fernandes, Bohumil Med and Reginaldo Carvalho. He pursued his specialization at the Groupe de Recherches Musicales / Conservatoire de Paris, with Pierre Schaeffer and Guy Reibel, becoming their assistant. He later got his PhD with Denis Smalley, in England. He attended classes in a graduate course in Philosophy at the Federal University of Rio de Janeiro. Being one of the founders of the Estúdio da Glória in Rio de Janeiro, he had the opportunity to teach and compose there with the aid of electroacoustic technology. He was also a teacher at the Brazilian Music Conservatory and at the Estácio de Sá University, he produced and performed in radio shows about contemporary music and regularly participates in events in Brazil and abroad. He is currently a professor at the Federal University of Rio
de Janeiro where he coordinates the Music and Technology Laboratory (LAMUT). He also 11 coordinates the website sussurro.musica.ufrj.br, where you can listen to great part of
his works and countless contemporary Brazilian music productions.

His compositions have been well received in contests and rankings in Bourges, Noroit, Keele, Unesco Tribune, and in some of those he received commissions and prizes, such as: Arts Council of Great Britain, Arts Council of England, Institut National de l’Audiovisuel / Groupe de Recherches Musicales, Fundação Vitae and RioArte Scholarship Program. He received the Sérgio Motta Prize in 2004 and an honorable mention in Bourges with his 3 Clips, where he explores the relations between sight and hearing. Interdisciplinary relationships constitute the core both of his artistic creation and his theoretical work.The four pieces in this album were composed between 1992 and 1997.

The three first ones in England, while Rodolfo Caesar was studying for his PhD: Volta Redonda, Revoluções Industriais and A noite em concha. Círculos ceifados (1997), that in a way stems from the same root, was composed in Brazil as a part of a work sponsored by the Vitae Arts Fund (the homonymous book, published in 2008, is from the same project). The common ground among those pieces is the exploration of a structure based on circular, spiral and conic forms. The technical resources vary a lot: Volta Redonda was composed in the studios of the East Anglia University; the other ones were composed in his private studio or in MIDI environment, or with extensive use of an audio card. All pieces were originally conceived thinking of stereo reproduction, as in this album.

Marcos Branda Lacerda